sexta-feira, 22 de julho de 2011

Os tutores da liberdade alheia!

Meu texto sobre a liberdade de exercício de qualquer profissão, obviamente, não teve tanta aceitação fora dos ambientes libertários. Muitos ficaram chocados com meu ponto de vista. Mas nenhum dos meus debatedores se disse abertamente contrário à liberdade. Eles jamais assumem isso. Eles apenas se dizem preocupados com o caos que a liberdade extrema causaria e acham que muitas pessoas, coitadinhas, se fossem livres ficariam à mercê de aproveitadores. Vez ou outra eles recorrem àqueles jargões socialistas que eu chamo de trilogia do mal: função social, justiça social e consciência social. Em regra são educados e tratam você bem, afirmando ter respeito por suas posições, embora discordem delas.

Eu os chamo de tutores da liberdade alheia.

São pessoas iluminadas que querem proteger certas pessoas contra elas mesmas, porque acham que essas pessoas não saberiam ser livres e não teriam condições de arcar com as responsabilidades de suas próprias escolhas.

O lema deles é o seguinte: "eu sei ser livre, mas alguns não sabem". Eles enchem o peito e dizem: "eu sei o que fazer com minha liberdade, mas há pessoas que não sabem, então temos que protegê-las contra elas mesmas".

Nem se atreva a defender a liberdade de um pobre ou de uma pessoa sem instrução: um tutor da liberdade alheia, bem intencionado, com consciência social e sempre preocupado apenas com o bem comum vai xingá-lo de extremista.

O que o tutor da liberdade alheia indiretamente diz, sem coragem de afirmá-lo expressamente, é isso: "como nem todos são iguais a mim, não quero liberdade para todos".

O mundo está cheio de tutores da liberdade alheia, todos muito bem intencionados e preocupados com o caos que a liberdade dos outros representa. Saiam pra lá!

Tutores da liberdade alheia, deixem as pessoas em paz e vão cuidar das suas vidas. Guardem suas boas intenções para vocês mesmos!

André Luiz Santa Cruz Ramos

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Pela liberdade de exercício de qualquer profissão! Uma observação a mais...

O André escreveu um artigo simples e definitivo abaixo sobre a regulamentação da advocacia.

Muitas pessoas acham que o exame da Ordem constitui "um mínimo" de conhecimento que deve ser exigido de todo bacharel em benefício e proteção da sociedade. Bobagem. A aprovação no Exame não garante nem esse suposto mínimo. Os atuais aprovados podem passar os próximos anos sem pegar num livro de Direito e ainda assim poderão continuar inscritos na OAB (portanto, advogados). O que os distinguirá dos reprovados de hoje?

Além disso, ninguém é especialista em tudo nem tem conhecimento "mínimo" de todas as áreas. Qualquer advogado poderia indicar uma área na qual é totalmente leigo (pergunte a um Administrativista sobre o mecanismo da Tag Along do Direito Societário). Por outro lado, é possível encontrar inúmeros profissionais com outras formações que, por circunstâncias diversas, se tornaram especialistas em uma determinada área regulada por lei, mas que não podem ser advogados, caso não cursem uma faculdade de Direito e depois sejam aprovados no exame (um funcionário de cartório que sabe tudo de Direito de Família, um contabilista que conhece todas as regras tributárias em vigor ou um profissional de marketing que entende de propriedade intelectual).

Esses profissionais seriam muito mais valorizados no mercado jurídico do que um advogado recém-formado com carimbo da Ordem. Agregariam, assim, muito mais valor à sociedade se estivessem livres para ofertar suas habilidades.

Como qualquer medida regulatória, o Estatuto da Ordem despreza a liberdade individual e o direito de escolha. Se não existisse OAB, as pessoas buscariam os profissionais de acordo com sua necessidade e de um modo que não impressionaria ninguém: análise de currículo. Se uma grande empresa deseja contratar um profissional para integrar seus quadros, ela pode achar suficiente saber que o candidato formou-se em uma renomada universidade (Usp, Puc, etc), que trabalhou durante certo tempo em escritórios de ponta, que é pós-graduado em determinada especialidade.

Por outro lado, um sujeito que precisa separar-se da mulher, mas que não está disposto a gastar muito dinheiro no processo, pode achar suficiente os serviços de um jovem bacharel que estagiou em uma Vara de Família.

Ninguém precisa ser protegido pelo Estado. O Estado não é melhor do que você para fazer a escolha de quem contratar. Eu não preciso entender de roupa e de moda para comprar roupas bonitas e estar sempre "na moda". Posso confiar nos estilistas e nas marcas que o mercado definiu como melhores (Zara, Calvin Klein, Burberry). Se não me animo em gastar muito com determinadas peças, posso ir na Riachuelo ou C&A e sair satisfeito. Se não gostar do produto ou do atendimento, não volto à loja e vou ao concorrente.

Os serviços jurídicos podem funcionar de forma semelhante. Há muitos escritórios cujas marcas já se tornaram sinônimas de excelentes serviços. Duvido que alguém que contrate com algum desses escritórios procure saber se os profissionais que ali estão foram todos aprovados no exame da Ordem.

Mais: um mercado sem o monopólio da OAB não implica mercado jurídico em desordem ou até mesmo desregulado. Como o André ressaltou, muitas associações poderiam surgir e criar um "selo de qualidade" nos profissionais que desejassem submeter-se, voluntariamente, ao seu exame, com as suas regras e exigências. O mercado cuidaria de dar a credibilidade devida a cada entidade. Isso não é estranho a outras áreas, por que seria no mundo jurídico?

A Microsoft e a Apple, por exemplo, certificam profissionais especialistas em seus produtos e esses técnicos ganham, naturalmente, um status mais elevado no mercado de Tecnologia da Informação. Mas ninguém é obrigado a submeter-se a tais exames e nem a contratar tais profissionais. Podemos, portanto, colocar nossos computadores nas mãos de qualquer pessoa, inclusive daquele nerd, filho do vizinho.

Em resumo: nem o Estado nem a OAB nem ninguém é melhor do que você para escolher com quem contratar serviço jurídico. Ponto final.

Thiago Guterres

Pela liberdade de exercício de qualquer profissão!



Ontem foi realizado, em todo o Brasil, mais um exame da OAB, uma prova a que todos os bacharéis em Direito que querem advogar devem se submeter, sob pena de não serem qualificados como advogados e serem impedidos de exercer a profissão. Em suma: só é advogado quem a OAB diz que é advogado. Por isso ela defende tanto o tal exame.

Se você defende o livre mercado genuíno, deve ser contrário a qualquer regulamentação de profissões e apoiar a desregulamentação total delas. A exigência de diploma para exercício de uma profissão já é absurda. Exigir, além do diploma, que a pessoa passe numa prova realizada por uma entidade monopolista do direito de qualificar um profissional como tal é umabsurdo maior ainda.

Desregulamentar profissões é uma medida urgente. O estado não tem o direito de interferir no nosso direito de escolher com quem contratar a prestação de um serviço ou o fornecimento de um produto. Como eu mesmo já disse aqui em texto recente, “regulamentar profissões é uma forma extremamente eficiente de o Estado cartelizar uma determinada profissão, criando corrupção, ineficiência, piora dos serviços e aumento dos preços, ou seja, tudo o que a auto-regulação pelo livre-mercado impede que ocorra”.

Não caia na conversa fiada de que certas profissões (medicina, engenharia, advocacia etc.), por envolverem risco ou coisa parecida, precisam de regulamentação estatal para proteger o consumidor contra maus profissionais. A desregulamentação não vai implicar o exercício de profissões por quem não sabe exercê-las. Num livre mercado genuíno, com certeza surgirão associações (voluntárias!), que exigirão requisitos para a filiação (voluntária!) de interessados. Da mesma forma, vão existir profissionais que optarão (!) por não se filiar a nenhuma associação. Essas associações e esses profissionais independentes vão competir pelos clientes livremente, e para tanto vão procurar sempre apresentar mais e melhores qualidades.

Enfim, se eu for construir minha casa, eu vou pesquisar no mercado e decidir quem contratar. Se eu for processar uma empresa, eu vou pesquisar no mercado e decidir quem contratar. Se eu for fazer uma cirurgia, eu vou pesquisar no mercado e decidir quem contratar. Obviamente, alguns consumidores se sentirão mais seguros contratando um profissional com formação universitária e filiado a uma corporação respeitada, pagando, com certeza, mais caro pelos seus serviços. Outros optarão por contratar profissionais independentes e autodidatas, pagando menos, e assim por diante. Isso valerá para qualquer profissão.

Se eu quiser, por exemplo, obrigar uma loja a trocar um produto defeituoso, contratarei um rábula qualquer a preço módico. Em contrapartida, se uma empresa quiser discutir uma fusão milionária com outra, contratará uma banca de advogados conceituados, com boa formação acadêmica e filiação a uma associação profissional respeitada. Simples assim.

No fim das contas, quem ganha? Os bons profissionais (que se destacarão pelos seus méritos), as boas corporações ou associações (que ganharão respeitabilidade pelo bom filtro de profissionais que realizam) e os consumidores (que terão mais opções, tanto em preço como em qualidade, para escolher na hora de contratar).

Por outro lado, no atual modelo de profissões regulamentadas COMPULSORIAMENTE pelo estado (diretamente ou por entidades a quem ele confere esse poder, como a OAB), quem ganha? Apenas os maus profissionais, que têm medo da concorrência e lutam com unhas e dentes para diminuir o número de concorrentes.

Diga não à regulamentação! Diga sim à liberdade!

André Luiz Santa Cruz Ramos

Uma coisa é uma coisa. Outra coisa é outra coisa.

Se você, assim como eu, é um defensor do livre mercado genuíno, ambiente em que as pessoas são absolutamente livres para realizar trocas voluntárias segundo seus próprios interesses, sem qualquer interferência estatal, já deve ter ouvido de pessoas contrárias ao livre mercado a seguinte objeção: “mas os empresários só pensam no lucro. Eles nem ligam para os pobres e necessitados”.

Ora, mas o que uma coisa tem a ver com a outra? Será que todo indivíduo que obtém êxito em seus negócios tem o dever de repartir seus ganhos com as outras pessoas?

Não consigo imaginar ato mais moral do que obter lucro a partir de trocas voluntárias realizadas por indivíduos livres.

Por outro lado, a caridade privada, sem dúvida, é um ato virtuoso. Mas se trata de um ato voluntário. Ninguém pode ser obrigado a ajudar outras pessoas.

Por isso, defendo o seguinte princípio do LIBER (partido dos libertários): “todos os indivíduos têm o direito de dispor dos frutos do próprio trabalho como bem entenderem e que o governo não tem direito de tirar-lhes essa riqueza. Nós nos opomos à caridade governamental, tais como programas assistenciais e subsídios, mas aplaudimos veementemente os indivíduos e organizações de caridade que ajudam os necessitados e contribuem em uma grande variedade de causas valorosas através de atividades voluntárias.”

Viva a sociedade voluntária! Abaixo a institucionalização da violência!

André Luiz Santa Cruz Ramos

Consumidor: a parte mais forte da relação de consumo.

Quantas vezes você ouviu alguém dizer que o livre mercado é uma selva, onde os empresários gananciosos vão sempre prejudicar os consumidores indefesos? Várias vezes, né? Eu também. É nessas horas que os críticos do livre mercado justificam com mais veemência a existência do estado, alardeando que as leis de proteção ao consumidor são imprescindíveis etc e tal, e que sem elas os consumidores ficariam à mercê dos desmandos das empresas.

Se você é da área jurídica, assim como eu, deve saber que os consumeristas (é assim que são chamados os estudiosos do ‘direito do consumidor’) há tempos advogam a tal vulnerabilidade do consumidor, elevada pelo CDC (Lei nº 8.078/90) à categoria de princípio jurídico (art. 4º, inciso I).

Outro princípio jurídico do ‘direito do consumidor’ alardeado pelos consumeristas é a ação governamental em defesa do consumidor (art. 4º, inciso II), que se concretiza em uma série de práticas descritas no art. 5º do CDC, tais como criação de Juizados Especiais e Promotorias Especializadas.

Pois bem. Feita essa breve introdução, vamos ao que interessa. Se ajeite bem na cadeira e se prepare: vou PROVAR que o livre mercado é MUITO MAIS EFICIENTE do que o estado para regular a relação consumidor x fornecedor. Vou destruir o mito de que o estado é necessário para proteger o consumidor e mostrar que os consumidores é que são a parte mais FORTE da relação de consumo, como Ludwig Von Mises dizia há tempos. Vou deixar claro, por A + B, que a livre interação entre as pessoas pode criar um sistema auto-regulatório que funciona muito melhor do que qualquer sistema regulatório estatal. Adiante.

Como todo e qualquer fã de lutas, eu tentei desesperadamente comprar um ingresso para o UFC 134, que acontecerá no Rio de Janeiro em agosto. Com muito esforço, após mais de uma hora usando dois laptops, consegui comprar meu ingresso, coisa que muitos não conseguiram. Mas o pior estava por vir: dias depois recebi minha fatura do cartão de crédito, que apontava um débito equivocado de mais de R$ 5.000,00 em favor daingresso.com, empresa que cuidou da venda dos ingressos do evento.

Comecei, então, a tentar resolver o problema. Vocês acham que eu procurei o Procon, o Juizado Especial ou aPromotoria de Defesa do Consumidor? Que nada! Eu simplesmente entrei num site chamado Reclame Aqui. Trata-se de um site privado, criado por quatro pessoas (três administradores e um publicitário), com o objetivo de permitir que consumidores insatisfeitos publiquem suas reclamações contra as empresas com quem contrataram. As empresas, obviamente, sabendo que a publicação dessas reclamações é péssima para a sua imagem, tratam de resolver o problema rapidamente. Foi o que aconteceu comigo. Postei a reclamação no dia 08/07, e no mesmo dia a empresa entrou em contato, via e-mail. Estavam enrolando para resolver meu problema, então eu acrescentava diariamente um comentário negativo na minha reclamação. Ontem o problema foi resolvido, e hoje eles me ligaram pedindo desculpas pelo ocorrido.

Se eu tivesse procurado qualquer entidade estatal de defesa do consumidor, provavelmente teria enfrentado fila, seria mal atendido e estaria até hoje aguardando uma audiência ou coisa parecida.

Para finalizar, cito outro exemplo: o site de compras Mercado Livre, que possui um excelente sistema de auto-regulação: os consumidores avaliam os fornecedores, o que faz com que estes procurem satisfazer ao máximo aqueles, sob pena de serem mal avaliados e perderem a confiança de eventuais futuros compradores. Em vez de selvageria, portanto, o que se vê é um funcionamento perfeito do livre mercado, com crescimento vertiginoso das vendas. Quanto mais os juristas brasileiros reclamam da ausência de uma lei específica regulando o comércio eletrônico, mais as vendas pela internet crescem. No dia em que essa lei for editada, as coisas só vão piorar.

Seja contra qualquer lei regulamentando o comércio eletrônico. Os consumidores são soberanos. Não entreguem essa soberania ao estado.

André Luiz Santa Cruz Ramos

sábado, 9 de julho de 2011

Uma diferença fundamental...



Através do meu twitter, eu sigo várias entidades que criticam duramente a tributação no Brasil. Posso citar alguns: "dieta do impostão", "sombra do imposto" e "movimento Brasil eficiente".

Não posso negar que eles têm prestado um bem real à sociedade brasileira, alertando nosso povo quanto à altíssima carga tributária de nosso país, que tem chegado a patamares proibitivos ao empreendedor brasileiro e sufocado as nossas famílias, sobretudo as mais pobres, as quais, coitadas, muitas vezes nem sabem que pagam tantos impostos, taxas, contribuições e afins.

A luta pela transparência da tributação é importante? Sim, claro. Quanto mais as pessoas souberem o quanto de dinheiro o estado tira delas, melhor. Isso ajudará a conscientizá-las e com certeza fará com que elas passem a exigir, cada vez mais, a diminuição da carga tributária.

A luta pela redução da tributação também é importante? Sim, com certeza. Ninguém deve alimentar a vã ilusão de que o estado morrerá da noite para o dia e que a tributação vai ser extinta, num passe de mágica. Enquanto isso não acontece, que pelo menos paguemos menos impostos.

O "problema" dessas entidades, portanto, é outro. Elas não atacam a tributação por serem essencialmente contrárias a essa prática do estado. Elas não consideram o tributo um roubo, nem vêem a tributação como algo intrinsecamente imoral. Em suma: parece que elas ainda não entenderam a verdadeira natureza da tributação.

Uma dessas entidades, o "Movimento Brasil Eficiente", chega a concordar com a alta tributação de alguns produtos, como bebidas e cigarros, como forma de "conscientizar o consumo" dessas substâncias. Mais ainda: defendem abertamente que os recursos arrecadados com a alta tributação desses produtos sejam "carimbados", isto é, tenham destinação específica. Sabem para quê? Para tratar as pessoas que adoecem em razão do alccolismo ou do fumo.

Não dá para concordar com isso! Se a tributação em si já é um absurdo, por constituir uma violência injustificada contra cidadãos não-agressores, a alta tributação de produtos com o objetivo de desestimular seu consumo é um absurdo maior ainda, porque ignora dois fatos: (i) as pessoas devem ser livres para decidir o que fazer com suas vidas; (ii) as empresas devem ser livres para oferecer produtos e serviços àqueles que quiserem, por meio de trocas livres e voluntárias, adquiri-los. Agora o mais absurdo de tudo isso é pegar os recursos dessa alta tributação (uma violência qualificada, portanto) e destiná-los ao tratamento de um grupo específico de pessoas, que adoeceram em conseqüência de atos voluntários seus.

Podemos lutar juntos pela transparência na tributação? Sim, com certeza!

Podemos lutar juntos pela redução da carga tributária? Sim, com certeza!

Mas não dá para lutarmos juntos por um estado eficiente, que tribute de forma consciente etc., simplesmente porque isso é impossível.

André Luiz Santa Cruz Ramos

sexta-feira, 8 de julho de 2011

O Novo Código Comercial brasileiro: a última trincheira



Desde que o professor Fábio Ulhoa Coelho, um dos mais respeitados comercialistas brasileiros, lançou seu último livro (O Futuro do Direito Comercial), a comunidade jurídica de nosso país debate a necessidade de edição de um novo Código Comercial, que substitua o atual (datado de 1850 e já quase todo revogado, atualmente tendo apenas regras que disciplinam o comércio marítimo) e revogue a parte do "Direito de Empresa" constante do Código Civil de 2002.

A tese do professor Fábio Ulhoa Coelho, reforçada no painel de abertura do I Congresso Brasileiro de Direito Comercial, realizado em 25/03 em São Paulo, bem como em debates ocorridos nos dias 27, 28 e 29/04, em 3 capitais nordestinas (Fortaleza, Recife e Natal), dos quais tive a honra de participar, é a seguinte: os valores do Direito Comercial foram esquecidos pelos operadores do Direito e precisam ser urgentemente resgatados. Nas palavras do professor, os valores do Direito Comercial, que compõem o tecido dessa disciplina, estão esgarçados, cabendo a nós a tarefa de recosê-los. Ainda segundo o professor, nada melhor do que a edição de um novo Código Comercial para que tal intento seja alcançado. Um código atento à nova realidade econômica brasileira faria o Direito Comercial ressurgir nos mais variados fóruns de debate jurídico, da academia ao Poder Judiciário.

Não se pode negar que o professor Fábio Ulhoa Coelho tem absoluta razão. Não por acaso, sua proposta tem sido bem recebida nos meios jurídico, político e empresarial. Com efeito, grandes juristas já manifestaram apoio público à proposta, merecendo destaque o lúcido artigo publicado pelo jurista Arnoldo Wald no Valor Econômico de 29/04. Além disso, importantes autoridades públicas deram sinais de apoio à proposta, como o Ministro da Justiça José Eduardo Cardozo, que deve instituir em breve comissão para estudar o tema. Na Câmara e no Senado, também em breve, serão realizadas audiências públicas. Finalmente, os empresários, maiores interessados na proposta, também já expuseram publicamente sua adesão a ela, através de grandes associações, como a FIESP.

Embora não me encaixe em nenhuma das categorias acima listadas – jurista, político ou empresário – ouso manifestar-me sobre o tema, para somar aos argumentos do professor Fábio Ulhoa Coelho em defesa de um novo Código Comercial alguns outros, que entendo serem de extrema relevância.

Um novo Código Comercial é necessário, basicamente, por dois motivos: (i) corrigir os tristes erros do Código Civil em relação ao Direito Comercial; e (ii) defender o livre mercado.

A tentativa de unificação legislativa levada a efeito pelo Código Civil de 2002 trouxe graves problemas para o Direito Comercial (hoje também chamado de Direito Empresarial), a saber: a) contratos cíveis e mercantis passaram a ter uma mesma 'teoria geral', ignorando-se a enorme distinção que há entre eles; b) normas gerais sobre títulos de crédito foram criadas, em total descompasso com as leis existentes, notadamente a Lei Uniforme de Genebra, incorporada há décadas ao nosso ordenamento jurídico em razão da assinatura de um Tratado internacional; c) a sociedade limitada, antes submetida a um flexível e enxuto arcabouço normativo, tornou-se uma figura societária burocrática e engessada; d) institutos jurídicos receberam tratamento confuso e atécnico, gerando dificuldades interpretativas que trazem insegurança jurídica, como ocorre no caso da difícil distinção prática entre sociedades simples e empresárias; e) velhos costumes jurídicos consagrados na praxe forense, como a desnecessidade de outorga conjugal para prestação de aval por pessoa casada e a possibilidade de contratação de sociedade entre cônjuges independentemente do regime de bens, foram injustificadamente alterados; f) novas figuras jurídicas, já conhecidas no direito estrangeiro, perderam a chance de serem adotadas, como a sociedade limitada unipessoal e o empresário individual de responsabilidade limitada.

A mera oportunidade de corrigir esses graves erros decorrentes da unificação legislativa, copiada da codificação italiana "fascista" de 1942, já seria motivo suficiente para a edição de um novo Código Comercial. Mas há também um outro motivo, ainda mais importante: a defesa do livre mercado!

Exatamente no momento em que o Brasil vive uma oportunidade única de crescimento e prosperidade, aumenta exponencialmente a intervenção do Estado na economia, criando-se um paradoxo inexplicável e injustificável. Princípios básicos do regime capitalista, como livre iniciativa e liberdade contratual, são solenemente desrespeitados. O Estado regula cada vez mais a economia, criando e sustentando duopólios e oligopólios em setores estratégicos, como aviação e telefonia. O Poder Judiciário se sente cada vez mais à vontade para intervir nos contratos, e relações empresariais simétricas sofrem pesadas limitações de um dirigismo contratual descabido. A carga tributária chega a percentuais proibitivos ao empreendedor, quebrando empresas e tirando a competitividade de produtos e serviços dos abnegados empresários brasileiros. As intocáveis leis trabalhistas, que só prejudicam os trabalhadores a que visam proteger, impedem a criação de empregos e burocratizam o mercado de trabalho. Os pacotes de socorro em tempos de crise distorcem a regra de competição empresarial, criando risco moral e favorecendo apenas os "empresários" bem relacionados. Em suma: não se tem um ambiente de livre mercado genuíno.

O observador mais atento pode questionar: um novo Código Comercial não resolve esses problemas. Para tanto, seria necessária uma profunda reforma do Estado. Em parte, é verdade. Mas muita coisa pode melhorar com a edição de um novo Código Comercial, desde que ele seja uma lei concisa e principiológica, que, por exemplo: a) assegure a plena autonomia da vontade das partes, em respeito à simetria natural das relações contratuais empresariais; b) estimule a arbitragem como meio de solução de conflitos entre empresas; c) dê condições ao surgimento e desenvolvimento de órgãos auto-regulatórios, sobretudo no mercado de capitais e no ambiente de fusões e aquisições; d) desburocratize os serviços de registro de empresas, assegurando a livre iniciativa e a livre competição verdadeiras. Enfim, um código que se limite a assegurar, sem medo, a LIBERDADE.

Não foi à toa que o Direito Comercial nasceu como um direito consuetudinário, a partir da compilação dos usos, costumes e práticas mercantis dos mercadores burgueses medievais. O genuíno Direito Comercial é a Lex Mercatoria, isto é, a regra que nasce da interação livre e voluntária dos que se dedicam ao exercício de atividade econômica. Um bom Código Comercial é o que, simplesmente, deixa o mercado funcionar.

O livre mercado, no Brasil (e no mundo também, infelizmente), vem sofrendo duros golpes, à medida que se desenvolve esse estranho capitalismo de Estado. Por incrível que pareça, a edição de um novo Código Comercial é a última trincheira dos que acreditam no capitalismo e no ideal de liberdade que ele carrega consigo. Portanto, que nos entrincheiremos e lutemos, mas armados apenas de idéias.

André Luiz Santa Cruz Ramos

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Sobre vinhos e liberdade

Ontem eu li um texto excelente, intitulado “CONCORRÊNCIA, MONOPÓLIO E ESTADO”, de “Alceu Gracia” (pseudônimo de Pedro Mayall Guilayn). Recomendo a leitura. Vários mitos sobre as tão elogiadas leis antitruste são desmontados de forma muito clara e didática, com explicação teórica muito bem embasada e citações de exemplos históricos com dados irrefutáveis.

Mas um ponto específico do texto eu quero destacar: lá na página 10, o autor deixa claro que os cartéis não se sustentam num regime de livre-mercado genuíno. Só quem consegue cartelizar um mercado é o Estado, com suas pesadas e esdrúxulas regulamentações. Querem uma prova? Vejam essa notícia sobre a regulamentação da profissão de sommelier. O texto do projeto de lei está aqui.

Mais uma profissão regulamentada pelo Estado em nosso país. Mais um cartel formado com uma mãozinha (aliás, mãozona) do Estado. Não pense que eu sou contra a regulamentação da profissão do sommelier porque eu acho isso um exagero e que só profissões mais complexas – medicina, engenharia, direito – devem ser regulamentadas. Se você pensa assim, então não estamos do mesmo lado.

Posso até confessar que eu já pensei assim também, mas hoje, depois de estudar o libertarianismo e de me aprofundar mais no estudo de doutrinas econômicas que defendem o livre-mercado genuíno (em especial a Escola Austríaca), percebi que a intervenção estatal na economia (ou em qualquer área de nossas vidas!) NÃO é um mal necessário (quantas vezes você já ouviu isso da boca de socialistas e estatistas enrustidos?), muito menos quando se trata das tais regulamentações de profissões, é um mal e pronto.

Portanto, hoje eu penso de outra forma sobre esse tema. Ao ler esses textos, você vai perceber que “quando regulamentam profissões, parlamentares caem na esparrela de acreditar que estão defendendo o público. Potoca. Estão apenas defendendo um mercado cativo para grupos politicamente organizados que buzinaram nos seus ouvidos que eles deviam regulamentar alguma profissão”.

Com certeza, nesse caso da regulamentação do sommelier, ocorreu exatamente isso. Agora, um mercado cativo para empresas que fornecem “cursos de vinhos” está devidamente assegurado pelo “papai” Estado. Tudo graças ao art. 2º dessa nova lei (alguém duvida que ela vai ser promulgada e sancionada?): “Somente podem exercer a profissão de Sommelier os portadores de certificado de habilitação em cursos ministrados por instituições oficiais públicas ou privadas, nacionais ou estrangeiras, ou aqueles que, à data de promulgação desta Lei, estejam exercendo efetivamente a profissão há mais de 3 (três) anos”.

Você acha que isso melhorará os serviços? Claro que não! Muitas dessas instituições públicas ou privadas “certificadoras” logo vão perceber que podem “vender” diplomas sem precisar oferecer o curso, e alguém que não sabe distinguir um “Sangue de Boi” de um “Romanée Conti” se apresentará por aí como um sommelier “certificado”. Já aquele autoditada, que trabalha no ramo há trinta anos e sabe tudo de vinhos, mas que se recusa a passar pela humilhação de ser certificado por um “certificador” fajuto ou pagar caro para ter um atestado de que ele é o que é, logo será acusado pelo sindicato da categoria (se não existe, em breve vai ser criado) de ser um profissional “não-regulamentado”. Pelo menos a lei assegurou o direito de ele continuar trabalhando (vide art. 2º, parte final).

Os restaurantes que se cuidem. Os preços pelos serviços desses profissionais devem subir. Não apenas porque eles terão custos para adquirir ou “comprar” sua formação profissional, mas também porque seu sindicato vai logo crescer e a tendência é que, em breve, um piso salarial para a classe seja fixado.

O consumidor também perde nessa história toda. Como os restaurantes, de acordo com o art. 1º, parágrafo único, da esdrúxula lei, não são obrigados a oferecer o serviço de sommelier (UFA! Mas isso é assim por enquanto, viu? Em breve, quem sabe...), muitos estabelecimentos, por não conseguirem arcar com os custos do serviço desse profissional regulamentado – que, como eu disse, devem subir –, simplesmente não vão mais oferecê-lo aos seus clientes. Se vire para harmonizar o seu prato com um vinho adequado. Antes de sair de casa, visite sites especializados.

É isso, caros brasileiros: regulamentar profissões é uma forma extremamente eficiente de o Estado cartelizar uma determinada profissão, criando corrupção, ineficiência, piora dos serviços e aumento dos preços, ou seja, tudo o que a auto-regulação pelo livre-mercado impede que ocorra.

E aí, pessoal, gostaram do mais novo presente que os nossos parlamentares nos deram?

André Luiz Santa Cruz Ramos