sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Propriedade pública x propriedade privada.


Leia o texto abaixo:

“As chuvaradas de verão, quase todos os anos, causam no nosso Rio de Janeiro, inundações desastrosas.
Além da suspensão total do tráfego, com uma prejudicial interrupção das comunicações entre os vários pontos da cidade, essas inundações causam desastres pessoais lamentáveis, muitas perdas de haveres e destruição de imóveis.
De há muito que a nossa engenharia municipal se devia ter compenetrado do dever de evitar tais acidentes urbanos.
Uma arte tão ousada e quase tão perfeita, como é a engenharia, não deve julgar irresolvível tão simples problema.
O Rio de Janeiro, da avenida, dos squares, dos freios elétricos, não pode estar à mercê de chuvaradas, mais ou menos violentas, para viver a sua vida integral.
Como está acontecendo atualmente, ele é função da chuva. Uma vergonha!
Não sei nada de engenharia, mas, pelo que me dizem os entendidos, o problema não é tão difícil de resolver como parece fazerem constar os engenheiros municipais, procrastinando a solução da questão.
O Prefeito Passos, que tanto se interessou pelo embelezamento da cidade, descurou completamente de solucionar esse defeito do nosso Rio.
Cidade cercada de montanhas e entre montanhas, que recebe violentamente grandes precipitações atmosféricas, o seu principal defeito a vencer era esse acidente das inundações.
Infelizmente, porém, nos preocupamos muito com os aspectos externos, com as fachadas, e não com o que há de essencial nos problemas da nossa vida urbana, econômica, financeira e social.”

Esse texto podia ser publicado em qualquer jornal carioca dos dias atuais, não é mesmo? E, de fato, esse texto foi extraído de um jornal carioca. Mas não foi um jornal de hoje, nem de ontem, nem da semana passada. Esse texto foi publicado na edição do dia 19 de janeiro de 1915 do jornal Correio da Noite. O autor é ninguém menos do que Lima Barreto, famoso escritor nacional, autor do conhecido livro “Triste fim de Policarpo Quaresma”.
De lá para cá já se passaram quase cem anos! E o Rio de Janeiro continua sofrendo com as chuvas: desabamentos, enchentes e mortes. Por quê? Essa é a pergunta que todos se fazem anualmente. A resposta é simples e consta do próprio texto de Lima Barreto, ainda que indiretamente: porque o responsável por cuidar da tal “coisa pública” é o Estado, por meio dos governos municipal, estadual e federal.
Muito dinheiro (roubado dos brasileiros via tributação) já foi entregue aos políticos e burocratas, ao longo desses anos todos, para que tais problemas sejam resolvidos, não só no Rio de Janeiro, mas em todo o Brasil. Em 2012, quase R$ 1 bilhão (http://contasabertas.uol.com.br/WebSite/Midias/DetalheMidias.aspx?Id=2412). No entanto, as tragédias decorrentes das chuvas têm sido uma constante em diversas cidades brasileiras: boa parte desse dinheiro é desviada para a vala da corrupção, outra parte é desperdiçada em obras ineficientes e apenas uma pequena porção da dinheirama é usada em alguma obra que realmente resolve algum problema.
Obviamente, os políticos e burocratas sempre alegam que o problema não foi totalmente resolvido porque o dinheiro foi pouco. E, assim, no próximo orçamento mais dinheiro roubado dos “contribuintes” será entregue nas mãos deles.
Algumas tragédias naturais são realmente inevitáveis. Mas, quanto às centenárias enchentes do Rio de Janeiro (e de outras cidades brasileiras), como bem afirmou Lima Barreto em 1915, “o problema não é tão difícil de resolver como parece fazerem constar os engenheiros municipais”. Transformem a tal “coisa pública” em propriedade privada e deixem o dinheiro roubado via tributação nas mãos dos seus verdadeiros donos, para que eles mesmos cuidem de suas casas, ruas, praças etc. Feito isso, muito menos do que cem anos serão necessários para que essas enchentes virem apenas uma triste lembrança dos tempos em que o Estado era o zelador da área.

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